Uma noite da semana passada, apanhei o comboio com destino a Winchester.
O sudoeste de Londres já ficara para trás quando duas situações prementes me distraíram do livro que estava a ler. A primeira foi espetar uma esferográfica na carne flácida do homem sentado à minha frente, que dormia a sono solto e ressonava alto e bom som, produzindo ruídos guturais intercalados com estremecimentos, acompanhados de uma pieira desagradável, típica dos asmáticos. A segunda teve a ver com um gin tónico e um pacote de ‘snacks' crocantes.
Em nenhuma das situações agi por impulso. Pelo contrário. Obriguei-me a prestar o máximo de atenção ao livro, "I'll Have What She's Having: Mapping Social Behaviour", escrito por três académicos que defendem a teoria de que quase todas as nossas decisões se baseiam no acto de copiar.
Enquanto lia os seus argumentos, dei por mim a pensar que também eu copiara o comportamento dos passageiros que seguiam na minha carruagem. A razão porque não espetei uma esferográfica no tipo que estava a ressonar foi por ter constatado que ninguém se mostrava incomodado com a situação. E a razão porque não saí disparada para a carruagem-bar foi por ter compreendido que mais nenhum passageiro se tinha refugiado numa bebida super alcoólica e ‘snacks' salgados e cheios de gordura. Resumindo, fiquei quietinha e sentada no meu lugar, embora, por dentro, me sentisse em erupção vulcânica por estar a fazer o que os outros faziam.
No livro que já referi, diz-se que a vida é cada vez mais complicada, envolve mais pessoas e mais decisões e que, como tal, todos nós copiamos mais os comportamentos alheios. Reflectindo sobre isto, cheguei à conclusão de que tudo o que faço não passa de uma cópia. A ideia para esta crónica - sobre o acto de copiar - partiu do livro, sendo que os autores copiaram as suas ideias de estudos e artigos de outros académicos e investigadores das ciências sociais. Quando escrevo uma crónica, regra geral utilizo uma ideia que já existe e dou-lhe um toque pessoal. É como comprar um chapéu elegante e super caro e usá-lo descaído para o lado.
Não há razão para nos sentirmos envergonhados. Copiar é bom: enquanto raça, há muito que teríamos desaparecido da face da Terra se não o tivéssemos feito. O acto de copiar dá-me acesso a um mundo de ideias infinitamente mais rico e variado do que se estivesse limitada ao meu pequeníssimo ‘stock' pessoal. Acresce que copiar fez de mim uma pessoa melhor. A história da esferográfica - que não chegou a acontecer - é disso exemplo. As ideias copiadas tendem a ser as mais bem sucedidas. Bem vistas as coisas, mais vale usar um chapéu caro como acessório do que algo mais original e impróprio para pôr na cabeça, como um bife mal passado ou uma cadeira.
As empresas também copiam e fazem-no com talento. A Microsoft, por exemplo, construiu um império avaliado em qualquer coisa como 200 mil milhões de dólares (pouco mais de 145 mil milhões de euros) copiando terceiros. Até a Apple, referida constantemente como exemplo de uma empresa que faz as coisas à sua maneira, deve o seu rasgo à criação de tecnologias de referência a tudo o que Steve Jobs viu e aprendeu na Xerox.
Copiar é, no fundo, a essência da vida laboral. É por isso que a empresa virtual, o teletrabalho, nunca vão vingar - como muitos vaticinam. Se as pessoas trabalharem a partir de casa, quem poderão copiar? O mesmo se aplica aos líderes. Em tempos, tive um chefe que, depois do almoço, nos bombardeava com "n" ideias que havia copiado das pessoas importantes com quem se cruzara nesse espaço de tempo. Na altura, considerava esta atitude um ponto fraco e perguntava-me porque não teria ideias próprias. Hoje, porém, percebo que é um ponto forte: como passava o tempo a copiar, mantinha-se actualizado e flexível.
Apesar do seu valor inestimável, copiar tem o seu quê de desprezível. O significado que atribuíamos à palavra é, talvez, o exemplo mais acabado disso mesmo: usar cábulas ou outros meios fraudulentos num exame, e plagiar, embora este "acto" esteja a ser alvo de uma certa reabilitação. Basta lembrar que Anna Chapman, antiga agente secreta russa e actual conselheira da Jovem Guarda, organização de juventude afecta ao partido de Vladimir Putin, foi recentemente acusada de plágio por ter apresentado um trabalho de um relações públicas do Kremlin como sendo da sua autoria. Quando confrontada com as acusações, disse muito simplesmente: "Plágio é coisa do século passado".
Desprezamos o plágio, mas idolatramos a criatividade e a inovação. No site da Amazon existem 2.732 livros de gestão cujo título inclui a expressão "inovação". Todas as ‘business schools' leccionam cursos sobre este tema e todas as empresas dão prelecções sobre como gerar melhores ideias.
No entanto, só encontrei um punhado de livros que mencionam no título as expressões "imitar" ou "copiar". Curiosamente, todos são manuais de instruções de fotocopiadoras.
Quer-me parecer que ninguém está interessado em ensinar-nos a copiar melhor. Ora, isso é um erro monumental, uma vez que copiar, mais do que tudo o resto, é o que faz a diferença entre o êxito e o fracasso. Como temos vergonha de copiar, damos ao acto nomes pomposos para disfarçar - "melhores práticas" e ‘benchmarking' são apenas dois exemplos. Mas a mim não me enganam. Garanto-vos que é muito mais do que isso e que não é nada fácil fazê-lo bem.
Espero, aliás, que esta crónica seja um exemplo razoável de uma boa cópia. Sim, porque privar-me de um gin tónico foi tudo menos uma ideia brilhante. De facto, há comportamentos que não se devem copiar. Não só teria ficado mais bem disposta como teria contribuído para estimular a economia.
Exclusivo Financial Times
Tradução de Ana Pina
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