segunda-feira, 20 de março de 2023

«endogamia académica»

 


no artigo de opinião «Incompetência versus malícia» de Maria Manuel Mota no semanário Expresso desta semana.

Um excerto:

« (...)Pessoalmente, defendo uma sociedade baseada no conhecimento. Mas, para que este ocupe um lugar central na sociedade, as instituições que trabalham com e sobre o conhecimento têm obrigatoriamente que fazer parte dessa centralidade. Isso leva-nos, inevitavelmente, à universidade que desde a sua origem tem como missão criar, transmitir e disseminar conhecimento. Podemos pensar que esta é uma visão elitista, mas, pelo contrário, é uma visão inclusiva. A universidade está no ápice de todo o sistema educacional e de competências, que é o grande motor da equidade na nossa sociedade. É para a educação, e para as ferramentas que esta nos proporciona, que devemos olhar, se quisermos criar mobilidade social e uma sociedade inclusiva, e desenvolver e sustentar a prosperidade económica. A universidade tem o potencial de transformar vidas individuais que serão a base do desenvolvimento das diferentes comunidades.

Mas, para isso, precisamos de uma universidade dinâmica e inovadora. E, por isso, é sempre triste quando nos deparamos com a realidade e vemos quão longe desse ideal está a universidade em Portugal. Os números mais recentes da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência mostram que a grande maioria (68%) dos docentes doutorados nas universidades públicas portuguesas doutoraram-se na mesma instituição em que lecionam, enquanto as mais reputadas universidades internacionais consideram que esse valor não deve ultrapassar os 10%. Esta prática de endogamia académica, em que as instituições contratam os seus próprios doutorados para serem professores, impede a introdução de novas ideias, indispensáveis à criação de novo conhecimento e coloca as universidades portuguesas numa posição retrógrada, incapaz de gerar conhecimento inovador e de ter impacto na sociedade. A boa notícia é que muitas universidades noutros países já se depararam com este problema e foram capazes de o resolver, criando medidas claras, transparentes e baseadas no mérito para desencorajar a contratação de professores formados por elas próprias. Mas, sempre que estes números são conhecidos (e não melhoram!), aparece uma avalancha de críticas, muitas delas sugerindo a existência de um sistema corrupto, que permite esta situação tão danosa para todos. A estes críticos eu responderia: nunca atribuam à malícia aquilo que pode ser simplesmente explicado pela incompetência. E esta é mais difícil de corrigir, especialmente se não a admitirmos».

 

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