A natureza e as funções do Estado fazem parte dos conteúdos programáticos de mais do que uma das actuais unidades curriculares do curso de Gestão e Administração Pública do ISCAL. Para se continuar a reflectir esta matéria aqui está um bom contributo, o artigo de opinião de Vasco Pulido Valente (VPV) publicado na edição de hoje do jornal Público. Como na edição online o artigo só está disponível para os assinantes e como não o somos deu trabalho colocá-lo aqui.
O fim de uma época
07.06.2008, Vasco Pulido Valente
Toda a gente julga que vive o fim de uma época ou, pelo menos, de uma "época de transição". É muito difícil pensar que o nosso tempo não passa de um pequeno ponto da história, sem particular importância ou significado. Mas, de há vinte anos para cá, vivemos de facto o fim de uma época: a época do Estado-Providência. O Estado-Providência, o "Estado do berço à cova", apesar de ter raízes no século XIX, nasceu muito recentemente. Na "Europa", depois da II Grande Guerra. Em Portugal, depois do "25 de Abril". Em 1945, o Exército Vermelho estava em Berlim e o comunismo do Ocidente na sua máxima força. E mesmo onde não havia comunismo, havia um sentimento igualitário, irresistível e geral, que vinha do sofrimento e do sacrifício. Nenhum governo se atreveria a refazer a sociedade "velha".De resto, a América e a Europa (reconstruída com a ajuda americana) dominavam o mundo. A energia era barata e o "crescimento" contínuo. Foi nessa altura que o Estado-Providência começou a crescer. Não faltava dinheiro nem aos "privados", nem ao Estado e, para diluir o comunismo (principalmente em França e em Itália), nada melhor do que fornecer ao cidadão comum, além de um emprego seguro e regulado, ensino gratuito, saúde gratuita e uma reforma completa numa idade, digamos, "razoável". A esquerda e a direita (o socialismo e a democracia-cristã) não diferiam nisto. Pelo contrário, concorriam entre si para trocar sempre mais "direitos" pelo voto de que precisavam. Apesar da descolonização (excepto no caso de Portugal), as coisas correram bem até ao primeiro "choque petrolífero", em 1973. Dali em diante, o limite do exercício ficou à vista.Não vale a pena falar aqui das distorções que o Estado-Providência provoca: desde um enorme aparelho administrativo, que não funciona ou funciona mal, à irresponsabilidade do indivíduo. O problema é que o dinheiro deixou de chegar para a espécie de vida que ele instaurara e se tomava agora por garantida. Na "Europa" inteira (menos na América) governo atrás de governo tentou reduzir ou "racionalizar" o "monstro", para ser logo vilificado e expulso. Os serviços pioraram, a carga fiscal aumentou. Mas ninguém conseguia conceber que a "idade de ouro" acabara de vez. Para os portugueses, que verdadeiramente não a conheceram, a renúncia é ainda pior. E a resistência, contra a lógica e a realidade, será também por isso muito pior.
07.06.2008, Vasco Pulido Valente
Toda a gente julga que vive o fim de uma época ou, pelo menos, de uma "época de transição". É muito difícil pensar que o nosso tempo não passa de um pequeno ponto da história, sem particular importância ou significado. Mas, de há vinte anos para cá, vivemos de facto o fim de uma época: a época do Estado-Providência. O Estado-Providência, o "Estado do berço à cova", apesar de ter raízes no século XIX, nasceu muito recentemente. Na "Europa", depois da II Grande Guerra. Em Portugal, depois do "25 de Abril". Em 1945, o Exército Vermelho estava em Berlim e o comunismo do Ocidente na sua máxima força. E mesmo onde não havia comunismo, havia um sentimento igualitário, irresistível e geral, que vinha do sofrimento e do sacrifício. Nenhum governo se atreveria a refazer a sociedade "velha".De resto, a América e a Europa (reconstruída com a ajuda americana) dominavam o mundo. A energia era barata e o "crescimento" contínuo. Foi nessa altura que o Estado-Providência começou a crescer. Não faltava dinheiro nem aos "privados", nem ao Estado e, para diluir o comunismo (principalmente em França e em Itália), nada melhor do que fornecer ao cidadão comum, além de um emprego seguro e regulado, ensino gratuito, saúde gratuita e uma reforma completa numa idade, digamos, "razoável". A esquerda e a direita (o socialismo e a democracia-cristã) não diferiam nisto. Pelo contrário, concorriam entre si para trocar sempre mais "direitos" pelo voto de que precisavam. Apesar da descolonização (excepto no caso de Portugal), as coisas correram bem até ao primeiro "choque petrolífero", em 1973. Dali em diante, o limite do exercício ficou à vista.Não vale a pena falar aqui das distorções que o Estado-Providência provoca: desde um enorme aparelho administrativo, que não funciona ou funciona mal, à irresponsabilidade do indivíduo. O problema é que o dinheiro deixou de chegar para a espécie de vida que ele instaurara e se tomava agora por garantida. Na "Europa" inteira (menos na América) governo atrás de governo tentou reduzir ou "racionalizar" o "monstro", para ser logo vilificado e expulso. Os serviços pioraram, a carga fiscal aumentou. Mas ninguém conseguia conceber que a "idade de ouro" acabara de vez. Para os portugueses, que verdadeiramente não a conheceram, a renúncia é ainda pior. E a resistência, contra a lógica e a realidade, será também por isso muito pior.
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